segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A vida costa, Costa!

Não vale de nada falar em verdade, confiança e seriedade depois de se ter arrombado a própria casa porque isso é querer fazer os cidadãos de imbecis. Palavras vãs não resistem à mais leve brisa, já os actos de quem se predispõe a servir de forma intransigente o bem deixam a sua marca para todo o sempre na memória de quem os viveu e nos anais da História. O processo de selecção natural tem demonstrado a opção clara por líderes que tendem a falar pouco e a fazer muito e bem, ou seja, a dar execução a planos e projectos que, muito embora possam ter custos elevados, nomeadamente em termos sociais, vieram a capitalizar crescimento económico a médio e longo prazo e a proporcionar mais-valias ao nível das políticas sociais. Os políticos fúteis, plastificados e mediatizados que têm necessidade de se justificar a toda a hora e de aparecer continuamente nos media porque não têm conteúdo político, tentam substitui-lo por uma imagem presente e simpática que capta a condescendência popular, e, quem sabe, a sua confiança nos próximos actos eleitorais. Thatcher, Reagan e Cavaco Silva são exemplos de uma era em que, perante as adversidades, os eleitores preferiam as soluções mais arriscadas, mas mais confiáveis. Já nos anos 90 o paradigma alterou-se, preferindo-se os políticos mãos largas. Foi assim que, muito embora, a curto prazo, parecesse muito mais confortável oferecer aos cidadãos tudo o que eles exigiam ou pedinchavam, desequilibrando de forma irremediável as contas públicas, a verdade é que os problemas surgiram mais tarde. Empurrar com a barriga para a frente nos lugares públicos equivale a esconder o lixo debaixo do tapete em nossas casas, pelo que a questão é apenas adiada até ao momento em que os credores, cheios de razão, uma vez que apenas satisfizeram os nossos pedidos, nos vêm bater à porta a reclamar o que é seu.
O predomínio socialista até 2001 deixou o PSD confuso, uma vez que, em vez de ter permanecido nos registos de rigor e reformismo benévolos que desde sempre o caracterizaram, cedeu ao mediatismo e ao populismo, faltando-lhe um estilo e um pensamento estratégico para Portugal. Foi assim que perdeu o governo do país e de Lisboa. Hoje vimos o PS tentar resolver o que provocou, deitando areia para os olhos dos portugueses sem que o PSD intervenha e se afirme como alternativa credível. A questão da lei eleitoral das autarquias locais é apenas mais um dos casos que têm ferido de morte o PSD, uma vez que não se compreende como se pode aceitar o perpetuar do actual sistema com apenas algumas nuances. O executivo monocolor e o fim da intromissão das freguesias nas assembleias municipais é uma exigência da transparência democrática, da mesma maneira que não é admissível a existência de um governo composto por ministros eleitos por vários partidos e a representação das autarquias e regiões autónomas na Assembleia da República.
Quanto a António Costa, a situação actual espelha bem as razões da sua candidatura à Câmara Municipal de Lisboa: mero oportunismo de um partido que se comporta como um predador político que apenas quer ganhar para aumentar o seu poder e a sua visibilidade. Nem Portugal nem Lisboa são fins para o PS, mas apenas meios de publicidade para os seus protagonistas. Isso é bem visível no comportamento do governo ao longo dos últimos três anos e de António Costa em Lisboa nos últimos meses. O ímpeto reformista foi substituído por um ataque sem limites da propaganda que visa a reeleição de Sócrates em 2009, da mesma maneira que Costa se arma em vítima e ganha tempo mantendo um perfil baixo com o objectivo de se assumir frente ao eleitorado como formiguinha trabalhadora. A verdade, que ele diz defender, está bem longe do retrato fantasiado que o PS nos impinge a toda a hora. E ele reconheceu-o ontem na entrevista que deu na RTP quando descreveu a situação financeira da capital e a importância que o empréstimo representava para Lisboa e para si. O desalento foi bem visível no seu rosto.
Quanto ao reformismo do PS, parece mais uma brincadeira de legos do que outra coisa qualquer. O PRACE dedicou-se a mexer e remexer na Administração Pública sem produzir resultados efectivos na sua dimensão. E porquê? Porque não se redefiniram as funções do Estado (debate evitado por Sócrates a todo o custo porque sabe que o PS o baniria num piscar de olhos), pretendendo-se vestir um S num corpo XXL, o que, mais tarde ou mais cedo, levará a rupturas dramáticas no próprio Estado. Sintoma dessas rupturas é o fecho de maternidades, urgências e escolas.
O PRACE é um fracasso, tal como os 150 mil postos de trabalho e outras patranhas. Devemos, no entanto, reconhecer mérito a este governo no Plano Tecnológico, no SIMPLEX e no combate à fraude fiscal, ainda que moderado, uma vez que os seus efeitos poderiam ter sido muito maiores do que têm sido nos dois primeiros casos e excessivos no terceiro. Lisboa é também o espelho desse mesmo fracasso porque a sua situação teve origem no despesismo de João Soares. António Costa disse sentir frustração por causa da decisão do Tribunal de Contas mas deve-se sentir ainda mais frustrado por saber que o principal culpado da situação que encontrou é o seu partido. O pior é saber que a sua actuação política, tal como a do PS, se reduz à existência, ou não, de dinheiro. Fora isso, ou seja, fora o espalhar dinheiro, as soluções políticas são vazias e incongruentes, destinando-se a demonstrar que o país e Lisboa estão a progredir a alta velocidade quando, na realidade, patinam sobre o lodo submerso no largo do Rato.
Jorge Janeiro

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